No ano letivo de 1980-81, a Universidade de Aveiro formou a sua primeira licenciada em Engenharia Cerâmica e do Vidro, Ana Senos. Não só foi a primeira mulher, mas a primeira pessoa a completar este curso, numa época em que a área era predominantemente masculina. Desde então, seguiu uma carreira reconhecida na docência e investigação, deixando a sua marca no Departamento de Engenharia de Materiais e Cerâmica (DEMaC) ao longo das últimas décadas.
Os materiais sempre exerceram um fascínio especial sobre a docente, tanto pela sua funcionalidade quanto pela sua estética. "A minha infância passada na vizinhança da emblemática empresa da Vista Alegre despertou o meu interesse pela cerâmica", explicou. A escolha do curso na recém-criada UA permitiu “conjugar a continuidade dos meus estudos superiores com a minha vida pessoal”.
Estudar num curso novo e específico, como Engenharia Cerâmica e do Vidro, trazia consigo preocupações quanto à empregabilidade, especialmente para mulheres. "Na década de 70 a grande maioria das empresas cerâmicas não possuía quadros técnicos superiores e o grande desafio era o de mudar este paradigma com a entrada no mercado de trabalho de engenheiros altamente especializados nessa área e que deveriam ser capazes de promover a qualidade da produção e a inovação das empresas do setor”, recorda a professora. “Efetivamente, o tempo veio mostrar que a excelente formação académica dos licenciados em Engª Cerâmica e do Vidro e o seu elevado empenho profissional foram muito relevantes para a modernização e a competitividade das empresas cerâmicas portuguesas, num contexto que se traduziu numa empregabilidade total dos nossos licenciados e que se mantém até aos dias de hoje.”
Embora não se recorde de ter sentido preconceito ou discriminação durante os seus estudos, admite que ao longo da sua vida profissional vivenciou situações preconceituosas. “Mas que de forma alguma me marcaram, pois nunca me deixei intimidar pelas mesmas", afirmou com determinação.
Durante a sua carreira, envolveu-se em diversos projetos de investigação, principalmente na área do desenvolvimento microestrutural e processamento avançado de materiais cerâmicos e compósitos. Destaca-se a sua dedicação à investigação em parceria com a indústria: "Foi a que eu mais persegui desde o início da minha carreira", sublinhou. “Desta forma, as empresas e as instituições têm vindo a aproximar-se gradualmente, com uma contribuição muito positiva das empresas na formação dos alunos, e das universidades com transferência de conhecimento para as empresas, fomentando a sua inovação e competitividade”.
Olhando para trás, sente-se orgulhosa das gerações de alunos que ajudou a formar. "É sempre com muita satisfação que sigo os seus percursos e reconhecidos sucessos", disse. Um episódio marcante foi quando, durante uma visita a uma empresa cerâmica, vários ex-alunos seus vieram cumprimentá-la efusivamente. "Um dos alunos que me acompanhava disse: 'Professora, tem de estar muito orgulhosa por ter ensinado todos estes senhores e a receberem tão bem!'"
Para o futuro da Engenharia de Materiais e Cerâmica, a professora Ana imagina um campo em constante evolução, necessitando de materiais cada vez mais inteligentes e sustentáveis. "Vamos precisar sempre de materiais que melhorem a qualidade de vida e resolvam desafios globais em termos de saúde, energia e meio ambiente", afirma. Assim, deposita grandes expectativas nas novas gerações de engenheiros, munidos de sólidos conhecimentos científicos e tecnológicos, bem como fortes competências interdisciplinares. “É, por isso, nas futuras engenheiras e nos futuros engenheiros, que deposito as maiores expectativas para a evolução da Engenharia de Materiais”, afirma.
Para rematar, às jovens mulheres que consideram uma carreira em engenharia, oferece um conselho valioso: "Uma carreira em engenharia é feita de muito esforço e resiliência, mas também de muita realização. Abracem a vossa profissão com todo o entusiasmo e empenho que merece, mas não desistam nunca de ser ‘mulheres, filhas, mães e amigas’".
A trajetória da professora Ana Senos é um testemunho de perseverança e paixão pelo conhecimento, servindo de inspiração para muitas gerações de engenheiros e engenheiras. Deixou um legado extenso no DEMaC e é, assim, celebrada neste dia que destaca as conquistas e contribuições das mulheres engenheiras em todo o mundo, promovendo a igualdade de género no campo da engenharia.
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