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26 Fevereiro 2025

Catarina Custódio, cofundadora e CEO da spin-off Metatissue, em destaque na UA

Catarina Custódio, cofundadora e CEO da spin-off Metatissue, em destaque na UA

Licenciada em Química Aplicada e doutorada em Engenharia de Tecidos, Medicina Regenerativa e Células Estaminais, Catarina Custódio é atualmente investigadora auxiliar no CICECO - Instituto de Materiais de Aveiro, grupo de investigação Compass do Departamento de Química da Universidade de Aveiro (UA). Em conversa com a UACOOPERA, partilha um pouco do seu percurso de investigadora e empreendedora e deixa algumas dicas para quem quer transformar a sua investigação numa solução com potencial comercial.

Como foi o teu percurso até fundares a Metatissue®?

Eu sempre tive fascínio pela ciência, principalmente a química e a biologia. Fascinava-me a investigação científica mais aplicada e o encontrar soluções para problemas específicos que afetem as pessoas. No 9º ano do secundário, decidi que queria entrar em Química Aplicada-Biotecnologia na Universidade Nova de Lisboa, e seguir uma carreira na investigação. Naquela altura, esta escolha era totalmente alheia ao universo do empreendedorismo ou da criação de empresas, temas que, aliás, não eram discutidos nem divulgados como são hoje em dia.

Depois da formação em Química Aplicada, o meu percurso passou depois pelo Doutoramento em Engenharia de Tecidos, Medicina Regenerativa e Células Estaminais, na Universidade do Minho. Em 2016 vim para a Universidade de Aveiro onde atualmente sou investigadora assistente. Da investigação que fazia no grupo de investigação Compass resultou um produto que considerámos ter potencial comercial. Começámos por patentear a ideia e garantir a propriedade intelectual. A Metatissue foi fundada em 2018 por mim e pelo professor João Mano, e aí começou todo o novo desafio do empreendedorismo e do negócio, tudo novo para nós. Em 2021 conseguimos o primeiro grande financiamento como membros de dois consórcios em projetos europeus e só aí começámos a estabelecer a equipa e o nosso laboratório no Creative Science Park Aveiro Region (PCI).

Fala-nos um pouco sobre o principal objetivo da Metatissue® e o que a torna única no mercado em que atua?

core business da Metatissue é o design e manufatura de biomateriais produzidos a partir de proteínas humanas. Usamos tecidos que são considerados resíduos biológicos, nomeadamente sangue e placenta dos quais extraímos proteínas de interesse e criamos materiais de alto valor acrescentado. O nosso objetivo é fornecer aos nossos clientes materiais que mimetizem tecidos humanos nativos, para cultura de células e engenharia de tecidos. A nossa tecnologia permite-nos desenvolver materiais com propriedades mecânicas rigorosamente controladas e características bioquímicas que favorecem a cultura de células humanas em condições que se assemelham ao máximo ao ambiente nativo. Basicamente, proporcionamos às células humanas um ambiente que lhes permite sentir-se “em casa”, recriando de forma otimizada as condições presentes no órgão ou tecido humano.

Esta abordagem não só diferencia a Metatissue no mercado, como também representa um avanço significativo na área dos biomateriais, contribuindo para inovações na descoberta de fármacos, medicina regenerativa e nas terapias avançadas. Devo acrescentar que prevemos que esta tecnologia, quando aplicada à área dos ensaios pré-clínicos e descoberta de fármacos, pretende de forma sustentável e ética, reduzir drasticamente o número de animais que são atualmente usados em laboratório.

Quais foram os maiores desafios com que te deparaste na passagem da investigação científica para um projeto empreendedor?

Penso que os maiores desafios com os quais me deparei na transição da investigação científica para um projeto empreendedor estão intimamente relacionados com as questões financeiras e de gestão do negócio. Embora tenha participado em várias formações e beneficiado de mentorias que foram essenciais para adquirir conhecimentos fundamentais nesta área, reconheço que ainda há espaço para crescimento.

Além disso, um aspeto essencial foi a preocupação em constituir uma equipa sólida e competente. Atualmente, contamos com sete colaboradores a tempo inteiro, além de mim e do professor João Mano.

Um dos maiores desafios atuais está na progressão de vendas e contacto com possíveis grandes clientes, nomeadamente farmacêuticas e grandes empresas de biotecnologia. O facto de não termos uma equipa exclusivamente dedicada a vendas e marketing torna este processo mais difícil. Obviamente que os distribuidores desempenham um papel essencial e temos conseguido estabelecer parcerias com distribuidores na Europa, no Japão e nos Estados Unidos. Estamos numa fase crítica de procura de investidores.

Olhando para o início da Metatissue em 2018, os desafios têm estado em constante evolução. Felizmente ainda temos vários desafios pela frente, é isso que me tira noites de sono, mas também é isso que me estimula a trabalhar nesta área.

Como membro da Academia beneficiaste de diversos apoios da UA para quem quer empreender (por exemplo, concursos, capacitação). De que forma estes apoios ajudaram no desenvolvimento da spin-off?

Sim, na realidade, a Metatissue foi fundada como resultado da iniciativa “Empreende +” promovida pela UACOOPERA, em 2018. Estabelecemo-nos depois na Incubadora de Empresas da UA, no PCI. Estando na incubadora temos acesso a uma série de serviços essenciais que foram cruciais na fase inicial da Metatissue. Entre os diversos disponibilizados, destaco o apoio jurídico, o apoio na procura de financiamento, os serviços de contabilidade e o suporte na contratação de colaboradores. Além disso, a incubadora disponibiliza uma série de workshops e programas de capacitação que nos permitiram desenvolver competências essenciais, desde a gestão de negócios até ao marketing e inovação.

Para além dos apoios na área do empreendedorismo, contaram ainda com apoio na área da propriedade intelectual. Em que medida este apoio foi determinante para a definição da estratégia de proteção e valorização da vossa tecnologia?

O apoio na área da propriedade intelectual foi de facto uma componente essencial. Desde o início, a proteção da nossa tecnologia foi uma prioridade. Contar com a colaboração da equipa da UACOOPERA foi determinante, proporcionou-nos não apenas conhecimento técnico, mas também uma estrutura orientadora para a definição da nossa estratégia de proteção. O apoio da UACOOPERA ajudou-nos a compreender os diferentes mecanismos de proteção disponíveis, como patentes e direitos autorais, e a escolher as opções mais adequadas para a nossa realidade. Hoje, continuamos a beneficiar desse apoio, o que nos permite estar sempre atualizados sobre as melhores práticas e as novas regulamentações na área da propriedade intelectual.

Onde vês a Metatissue® nos próximos anos?

Vejo uma grande margem para crescimento nos próximos cinco anos, com planos para aumentar a equipa, expandir o nosso portfólio de produtos, aumentar o espaço de laboratório e dar início à produção industrial. Neste momento, estamos numa fase crucial de prospeção de vendas e captação de investidores. O investimento privado irá, naturalmente, resultar em ajustes, maiores ou menores, na estrutura da empresa, ajustes que considero essenciais para o nosso crescimento a longo prazo e que vejo sempre de forma positiva. Após estes cinco anos, temos várias opções em aberto, desde continuar com novas rondas de investimento até à possibilidade de vender a tecnologia a um grande player no mercado.

Que conselhos darias aos jovens investigadores que querem transformar a sua investigação numa solução com potencial comercial?

Acho que o processo começa sempre por identificar uma necessidade e, a partir daí, criar uma solução. Essa identificação surge, muitas vezes, em discussões informais, como conversas com profissionais de outras áreas, amigos durante um jantar ou eventos de networking. O importante é manter-se curioso e atento.

A criação da solução nunca pode obviamente ser feita por um único investigador; é essencial contar com uma equipa dedicada, que realmente goste do que faz e que tenha uma abordagem multidisciplinar. É provável que, durante este processo de investigação, surjam “acidentes” que levem à descoberta de soluções para problemas que nem tínhamos considerado - essa é a magia do processo.

Uma vez que a solução esteja mais ou menos delineada, é fundamental pensar na proteção da propriedade intelectual antes de divulgar ou publicar qualquer informação científica. O próximo passo é promover o nosso produto, interagindo o máximo possível com potenciais utilizadores e stakeholders, pois o feedback deles é essencial para melhorar a solução que desenvolvemos.

Por último, um conselho crucial: estejam preparados para enfrentar experiências que não correm como esperado e para ouvir “nãos” ao longo do caminho. Sejam criativos, resilientes e apaixonados pelo que fazem.

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